domingo, 22 de agosto de 2010

Conteúdos do Ensino Médio





Considero viável o ensino de limites, derivadas e integrais de funções de uma variável no Ensino Médio. Para tal seria preciso que as escolas deixassem de se preocupar com o que cai ou não no vestibular e não transformassem o terceiro ano em um cursinho pré-vestibular embutido no nível médio. Lecionei na EPCAR em Barbacena, em fins da década de 60, início dos anos 70 e lá não havia a mínima preocupação com o vestibular. Na Física usávamos os 4 volumes do PSSC, com todo o laboratório e os filmes, além dos “Tópicos Avançados”, no último semestre, em que se via momento angular, relatividade restrita, física atômica e molecular, física estatística e estado sólido. E na matemática se via, pelo SMSG, limites e derivadas (mas não integrais). O nível era excelente e não se tinha a preocupação de facilitar as coisas. Era exigido um nível puxado e quem não aguentasse, que saísse.
O nível de ensino pode ser melhorado no Brasil, se se incutir a idéia de que é preciso enfrentar tudo que é difícil, complicado e trabalhoso e aprender assim mesmo. O progresso do conhecimento está levando a fronteira cada vez mais para a frente, além do pós-doutorado. Urge, então, que os anos iniciais do nível superior já seja abordados no nível médio e o primeiro ano do médio ja passe para a oitava série do fundamental, comprimindo os conteúdos de modo a poder se ver mais coisas em menos tempo. Não apenas conhecimento, mas também o desenvolvimento de habilidades, formando ambos as competências. A pedagogia e a didática existem para que se consiga realizar tal proeza, com proveito e de modo a que o estudante frua prazer em ampliar suas competências acadêmicas. É um desafio imenso que, principalmente, está nas mãos dos Cursos de Licenciatura, que deveriam merecer muito mais atenção dos departamentos do que os bacharelados, mestrados e doutorados, pois é por via deles que se construirá a viabilidade do Brasil como nação cientificamente soberana no futuro.


Em verdade é necessário que profissionais de todas as áreas tenham noções, em nível básico, de todas as outras. No meu tempo (década de 1960), o Ensino Médio era compartimentado em Exatas, Biológicas e Humanas, separadamente. Isto é, alunos de exatas, como eu, não viam Biologia, Sociologia, Filosofia, enquanto de Biológicas não viam Física, Sociologia, Filosofia e de Humanas, não viam nem Física, nem Química, nem Biologia. Português, Matemática, Geografia, História e Inglês todos viam, mas com programas diferentes. Os de Exatas, além disso, viam Desenho Geométrico e Geometria Descritiva. Os de Biológicas viam Botânica e Zoologia e os de Humanas viam Francês e Latim. Isto preparava melhor para os vestibulares mas deixava formarem profissionais ignorantes nos assuntos que não lhes fossem específicos. Isto é mau para a sociedade e para o indivíduo. O Ensino Médio é básico e deve ser de conhecimento geral de todos profissionais de nível superior, qualquer que seja a área. Advogados têm que saber logarítimos e genética, engenheiros têm que saber filosofia e evolução, médicos têm que saber sociologia e termodinâmica, por exemplo. Em nível de Ensino Médio, que é elementar, bem entendido. Cálculo deve ser do conhecimento de pessoas de exatas, biológicas e humanas, pois se aplica a todas essas áreas. Matemática é uma linguagem, como o português. Para não sobrecarregar se poderia suprimir tópicos de interesse puramente técnico no Ensino Médio Regular Geral, que só seriam abordados no Ensino Médio Profissionalizante de quatro anos, conforme a área. Por exemplo, em Física, não se precisaria dar equilíbrio de barras, associação de capacitores e de resistores, calorimetria, espelhos e lentes e outras coisas. Tais conhecimentos não acrescentam compreensão do comportamento da natureza e são dados só para ter assunto para se fazer questões. São necessários apenas para quem for se profissionalizar na área. Por outro lado, noções fundamentais importantíssima são deixadas de lado, como análise dimensional, dinâmica das rotações e dos flúidos, elasticidade, movimento orbital, física estatística, fluxo elétrico, circuitação elétrica, ondas eletromagnéticas, teoria da relatividade, física quântica, física atômica, física nuclear, física molecular, física dos sólidos e física de partículas elementares. Tudo isso não cai no vestibular mas é importantíssimo para se conhecer os fundamentos do comportamento da natureza. É claro que a abordagem tem que ser mais conceitual, mas isto é que é importante no nível básico. Por outro lado, com o uso de derivadas e integrais, fica tudo mais fácil.


Os conteúdos do Ensino Médio são muito elementares para se dizer que alguém deve aprofundar mais ou menos neste ou naquele. Todos os conteúdos devem ser abordados em um nível elementar. Não será preciso saber todos os forames de todos os ossos e que nervos, artérias e veias passam por cada um, mas é preciso saber quais são os ossos e para que servem. Isto vale para advogados e engenheiros também. Da mesma forma todo mundo precisa saber história, geografia, filosofia e sociologia, bem como português e duas línguas vivas. Para mim seria bom saber latim também. Esta física, química e matemática elementares do Ensino Médio todo mundo tinha que saber também. Ainda acho que o Ensino Básico (fundamental e médio) tinha que ser em tempo integral (manhã e tarde, com almoço e dever na escola), com aprendizado de corte, costura, culinária, marcenaria, eletrotécnica, mecânica, hidráulica, construções, computação, datilografia, direção de veículos, música, desenho, pintura, dança, teatro, educação sexo-afetiva e coisas desse tipo para todo mundo, meninos e meninas. Sem contar a moral e civismo que foram abolidas como ranço da ditadura, mas que têm valor mesmo sem a ditadura. Além, é claro, da prática de esportes (mas não de desportos). Convivência, festas, jogos, tudo isto é educação.


O ENEM havia começando a abordar a questão da interdisciplinariedade. Achei isto ótimo, mas o novo ENEM voltou atrás. As questões não devem ser desta ou daquela matéria e sim virem embaralhadas na prova. Só contar o escore total, para qualquer curso, sem ponderação por área. E que todos os cursos superiores do Brasil adotem só o ENEM como forma de acesso. Seria ótimo! O problema  está nos professores. Os de física não sabem biologia nem história, os de geografia não sabem física nem matemática, os de português não sabem química nem geografia. Ora, no nível do Ensino Básico, todo profissional de qualquer área tinha que saber tudo, pois cai no vestibular de qualquer curso. A vergonha é que entram muitos com a pontuação mínima de 30%. E no colégio se passa com apenas 60% de conhecimento. Os próprios professores de cursinhos pré-vestibular não passariam no vestibular, pois só sabem a matéria que lecionam. Seria preciso que todos se reciclassem periodicamente nas outras matérias. Isto não é impossível, mas seria preciso que o governo priorizasse, de fato, a educação, dando um bom salário aos professores e contratando todos em dedicação exclusiva, com tempo para correção de provas, preparo de aulas e reciclagem pago. Ou seja, um piso salarial de cinco mil e um teto salarial de quinze mil no Ensino Básico, com remuneração que leve em conta o tempo de serviço, a titulação e, principalmente, a competência, aferida por avaliações periódicas. Isto é educação levada a sério, como precisa ser, aliás tudo.

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