segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Eternidade




É ontológicamente perfeitamente possível que o tempo não tenha tido um começo e que se extenda indefinidamente para o passado. Se tal se deu ou não é uma questão a ser decidida por analise dos dados observacionais. O argumento Kalam não procede porque ele diz que, se o tempo fosse infinito para o passado, então nunca se passaria um tempo suficiente para vir do início dos tempos até o presente e, como estamos no presente, por absurdo, o tempo não poderia se extender infinitamente para o passado. Há um erro neste argumento que é o de considerar que teria havido um tempo zero, infinitamente afastado para o passado. Não é isto que se diz ao considerar um tempo infinito para o passado. Isto significa que não houve tempo inicial nenhum. Por mais que se vá para o passado, sempre haveriam momentos anteriores. Pois bem, tal coisa não é vedada por nenhum princípio físico ou filosófico. Nem a segunda lei da termodinâmica que apenas diz que o tempo flui no sentido em que o estado global do universo posterior seja mais provável que o anterior. A diferença pode ser infinitesimal e a entropia (que é proporcional ao logarítimo da probabilidade) e nunca diminui, pode tender assintoticamente a zero quando o tempo tendesse para menos infinito.
Ao que parece, contudo, pelos dados observacionais, de fato, o tempo teve um instante zero, antes do qual ele não existia (e, logo, não havia “antes”). É fácil entender a ausência da passagem do tempo, pois ele só passa porque existem variações no estado do Universo. Se tudo estacionasse, o tempo não mais passaria. Isto é, o tempo é função da dinâmica do conteúdo do Universo. Se esse conteúdo não existir, não passa também o tempo. Ou seja, não havendo nada, também não há tempo (nem espaço, mas isto não está sendo discutido aquí).
No entanto há que se considerar outra coisa. Da mesma forma que não é vedado considerar que o tempo sempre existiu (e, portanto, o Universo, já que só há tempo no Universo), também é possível que o tempo tenha tido um começo, antes do qual não havia nada, nem tempo, nem espaço, nem conteúdo do Universo, nem mesmo vazio. Nesse tempo zero teria surgido, sem causa, o conteúdo do Universo, o espaço para contê-lo (já que não existe vazio no Universo) e o tempo para que ele evolua (já que o tempo não passa se nada mudar). Isto é importantíssimo que fique bem claro: não é necessário que toda ocorrência tenha uma causa. O princípio da causalidade é um preconceito que advém de um raciocínio indutivo, baseado na constatação do dia a dia dos fenômenos acessíveis à escala de tempo e de dimensões próximas ao ser humano. Basta um único contra-exemplo para derrubar um raciocínio indutivo. Nas escalas do extremamente pequeno e do extremamente grande, tanto em termos de espaço quanto de tempo, eventos se dão normalmente sem que possuam causa, isto é, que não sejam efeitos. Por exemplo, a emissão de luz por átomos excitados (a excitação é condição e não causa), devido à interação eletromagnética, o decaimento radioativo, devido à interação fraca e a produção de par partícula e anti-partícula, devido à interação forte, por flutuações do vácuo (que não é vazio). Na verdade, o determinismo e a causalidade são aparências que se dão em virtude da “lei dos grandes números” das probabilidades, no caso de eventos ocorridos com coleções de inúmeras partículas, como os corpos macroscópicos.
Kalam não é o nome de uma pessoa e sim das escolas de ensino religioso muçulmano. O denominado “argumento Kalam” era ensinado nessas escolas como uma prova de existência de Deus, semelhante à prova do “motor primo” de Aristóteles, também defendida por Tomás de Aquino. O que o argumento Kalam acrescenta ao motor primo é o fato de que se poderia arguir que uma alternativa à necessidade de uma causa primeira seria a eternidade do Universo para o passado. Provando que o Universo não poderia ser eterno para o passado se concluiria que, por ter tido um começo, teria que ter uma causa, extrínseca a ele (pois não existia) que se identificaria com Deus.
Dizer que algo “não faz sentido” é outro preconceito advindo de nossas concepções humanas sobre a estrutura da realidade. Os eventos que eu mencionei realmente não possuem causa, e não apenas têm uma causa não detectada. Não há problema nenhum em que o Universo tenha surgido sem nada precedente que o tenha causado (isto é o que se quer dizer quando se fala em “surgir do nada”). Quando um átomo está excitado e elétrons estão em níveis superiores de energia, esta condição possibilita que possam cair para níveis mais baixos, emitindo fótons. No entanto não há mecanismo nenhum que desencadeie esta queda e ela pode se dar ao fim de qualquer tempo ou nunca. A única informação que se tem é sobre a média estatística do tempo de decaimento (vida média) ou do tempo em que metade de uma população tenha decaído (meia vida). Realmente a natureza não é causal e nem determinística. Isto é o seu comportamento intrinseco, que a Mecânica Quântica veio descrever em seu modelamento matemático e que Einstein, por exemplo, por preconceito, não admitia. Outros físicos, como David Bohm, para citar um bem proeminente, também não conseguiram admitir a incausalidade, mas ela é um fato incontestável, a que temos que acostumar e que, juntamente com a relatividade do tempo e do espaço, foram as maiores implicações que a Física legou à Filosofia no início do século XX.
Um dos problemas da Filosofia, depois que se livrou das amarras da religião, é ainda estar presa às amarras do homem, de que precisa também se libertar para ser uma disciplina que procura refletir sobre a realidade tal qual é, e não como o homem a concebe. Mas não é fácil.
Não é logico que o tempo tenha que preceder o conteúdo do Universo. Primeiro porque a natureza não tem compromisso nenhum com a lógica, que é um construto humano para disciplinar o pensamento. A natureza absolutamente não é lógica. Mas, mesmo dentro da lógica, nada há que indique alguma precedência para o tempo. Uma análise lógica, pelo contrário, mostra que o tempo é uma ocorrência advinda das mudanças de estado do Universo. O conceito newtoniano de tempo e espaço absolutos e apriorísticos não tem guarida no atual estágio de conhecimento científico.
Não há dúvida de que somos nós, humanos, os observadores da realidade e, para complicar, somos também parte dela. Mas, como na Teoria da Relatividade - que busca justamente achar o que não seja relativo - o que importa é compreender a realidade de forma independente do observador, humano ou não. Para isto, é claro, tem-se que entender os mecanismos humanos de percepção da realidade para, justamente, abstrair-se deles.
Não é verdade que a entropia sempre cresça em um sistema isolado e sim que ela não diminua. Nos processos reversíveis ela permanece constante. O Universo poderia ter passado por um estágio, anterior ao big bang (se ele já existisse antes) em que toda mudança de estado fosse reversível.
Como eu descrevi em tópico anterior, não há impedimento do tempo ser eterno para o passado e, mesmo assim, estarmos no presente. Não é preciso haver uma contagem desde um instante inicial. Este pode nunca ter existido. Mas, mesmo que o tempo seja infinito, isto não esgota a ocorrência de todos os eventos possíveis, pois o infinito do tempo é o do contínuo (alef 1), enquanto o dos possíveis eventos é o dos subconjuntos contínuos, que é alef 2 (o conjunto de todas as possíveis funções) que é um infinito de ordem superior ao contínuo.
É certo que a natureza não é lógica e que o critério de verdade é a evidência e não a lógica. À medida, contudo, que o comportamento da natureza for sendo desvendado, mister se faz adaptar a lógica para que dê conta dos fatos. Assim surgiram as lógicas policotômicas e difusa, por exemplo. Outra coisa é que a lógica não garante a veracidade de coisa alguma, mas apenas a validade do raciocínio. Se ele for aplicado a premissas falsas, as conclusões, apesar de válidas, serão falsas. Todavia muito do que se diz ser lógico, absolutamente não o é, independente de ser verdadeiro ou falso. Tal é o caso, por exemplo, do princípio da causalidade, que poderia até ser verdadeiro (mas não o é), mas, absolutamente, não é lógico.
Quanto à questão da causa e do começo, vamos analisá-la. Uma vez que causa não é uma necessidade, então o Universo não precisa ter causa (mesmo que tenha) seja ele eterno ou não, para o passado. Considerando que tenha tido uma causa, no entanto, mister se faz que tenha tido um começo, pois, se não o teve, e os eventos se sucederam uns causando os outros, nenhum deles foi causa de todos, pois sempre houve um que lhe tenha antecedido e o causado. Então o Universo, que é o conjunto de tudo, incluindo os eventos, não teve causa, caso tenha sido eterno para o passado. Por outro lado, se ele teve um começo, poderia ter tido uma causa, mas, como antes do começo ele não existia, esta causa lhe seria extrínseca. Mas, como o Universo é o conjunto de tudo, nada lhe é extrínseco, logo teve que começar sem causa. Então, seja ele eterno ou finito, não pode ter tido causa. Se é eterno ou finito, para o passado, é questão de investigação observacional.
Na verdade a expansão do Universo se deu a partir de uma condição de densidade muito grande mas não infinita, isto é, não houve singularidade nenhuma. Pode ser que esta condição já existisse sem que passasse tempo, uma vez que era todo o Universo e não estaria sofrendo alteração de estado. Admitindo a descrição aleatória como válida, pode-se considerar que, sem razão alguma, ocorreu uma alteração no estado, caracterizada pela subita expansão. Nisto deu-se o surgimento do tempo e, daí, vem toda a história do big bang. É perfeitamente admissível uma explicação sem porquê, pelo menos este inicial. O objetivo maior da ciência é explicar “como” tudo ocorre, podendo também achar porque, caso haja. Mas não precisa haver.
Realmente o tempo só se move para o futuro (os modelos que consideram a possibilidade de volta ao passado, como o do Novello, assim o fazem indo para o futuro em uma curva tipo tempo fechada, mais ou menos como o toro do Caio). Mas isto não significa que ele tenha que ter tido um começo (não estou dizendo que não tenha tido, mas sim que poderia não ter tido sem inconsistência nenhuma, isto é, o argumento Kalam é falso). Repito: uma eternidade para o passado não significa um começo infinitamente distante, mas sim a ausência de um começo. Isto não inviabiliza a existência do presente.
Quanto às teorias de Everett, Bohm, Multiversos etc., tratam-se de conjecturas, elas sim, infalseáveis e meramente especulativas. Para todos os efeitos, o Universo é único. Quanto à incausabilidade e o indeterminismo, eles são perfeitamente falseáveis e os experimentos os confirmam.
Certamente nada pode estar localizado no infinito, seja ele temporal ou espacial, porque o infinito não é um ponto de coordenadas específicas. Infinito é apenas um símbolo que diz que aquela grandeza é maior do que qualquer valor que se possa imaginar. Dizer que o Universo seja eterno para o passado não é dizer que o momento de sua criação se localiza em menos infinito e sim que não houve criação nenhuma, isto é, que ele sempre existiu. Se houve uma criação, então sim, ela tem que se situar a um tempo finito no passado. Mas é possível que não tenha havido criação e nem surgimento incriado. Se isto parece ininteligível não o é mais do que supor a existência de um Deus eterno e incriado. Pode? Se pode para Deus, porque não para o Universo? Note-se que absolutamente não estou dizendo que o Universo seja eterno para o passado e sim que poderia ser, sem problema de ordem física e nem metafísica. Se é ou não é questão de investigar com base em dados observacionais. Por tudo que tenho conhecimento, não é, ou seja, houve um começo, no qual o tempo iniciou e quando surgiu o espaço e seu conteúdo. Note: ter surgido também não significa ter sido criado por algo extra-universal. Nada impede que tenha surgido do nada. Exatamente isto!
Algo que não tem causa não tem porquê. Não há explicação para uma ocorrência incausada. Ela acontece de modo fortuíto, ao acaso, sem motivo, sem razão. O preconceito está em supor que seja preciso se ter um motivo para cada evento. Há os que os têm e os que não os têm. Isto é normal na natureza, especialmente nos eventos elementares, isto é, experimentados pelos constituintes básicos do Universo, no nível mais profundo de redução. À medida que se eleva o nível de complexidade da ocorrência, então vão surgindo interações entre os eventos elementares que fazem com que possa se considerar relações de causa e efeito. No nível básico, tudo é aleatório. O acaso pode tudo e não tem explicação.
Como se pode ter certeza disto? Simplesmente não se tem. Aliás, certeza é algo impossivel de se ter, a respeito de qualquer coisa. A ciência não trabalha com certezas, mas com fortes indícios. Assim é muito mais plausível admitir-se a incausalidade do que a existência de causas ocultas. Mas nada do que a ciência propõe é garantido. É assim mesmo. Tudo é provisório e é preciso acostumar-se com esta postura. A ciência busca a verdade, isto é, descrições que tenham aderência ao comportamento da realidade, mas nunca sabe se a possui, apenas que dela se aproxima.
Não posso ter certeza de que não existem universos paralelos e nem de que existem. Então suponho que não existem, pois só tenho acesso a este. A existência deles, em sua própria concepção, é inverificável. É mais ou menos como o caso de Deus. Não posso garantir que exista ou não exista, mas não tenho comprovações de que exista. Então suponho que não exista. Esta é a hipótese nula, válida até que seja derrubada. Não se precisa provar que Deus não existe, mas sim que existe, pois não é evidente que exista. Tal é o estágio dos universos paralelos.
Só uma observação: se algo é um efeito, então tem causa, por definição. O que ocorre são eventos que não são efeitos. É possível que alguns eventos dos quais não se identifica a causa a possuam e isto venha a ser identificado no futuro. O que não se pode é considerar que a existência de causa seja uma necessidade. Não é! Não há argumento nenhum que exija causa para um evento. Isto é puro preconceito, advindo do senso comum. E como é uma conclusão obtida por raciocínio indutivo, não é logicamente necessária. É como as leis físicas, que valem enquanto não se descobre um fato que as contrarie. Então têm que ser corrigidas.
Produção de par de partícula e anti-partícula não é surgimento do nada, pois o vácuo não é vazio. Ele contém campos que possuem energia e outros atributos. Certamente tudo o que existe no Universo surgiu de partículas e anti-partículas que foram produzidas por flutuações do campo primordial, que era o único constituinte dos instantes iniciais da expansão. Mas não era nada e nem vazio. A questão ainda não explicada é a do surgimento desse campo ultra-concentrado, do qual tudo veio. Ou ele já existia antes que o tempo começasse a passar (o que se deu com o início da expansão) ou ele surgiu nesse momento. Neste caso a condição anterior era de inexistência de qualquer coisa: espaço, tempo, radiação, campos, matéria, com todos os seus atributos, como energia, carga elétrica, spin etc., inclusive as leis físicas. Isto é que se dá o nome de nada. Nada não é algo que exista. É só uma palavra para indicar a inexistência total. Até de Deus, que, aliás, continua não existindo.
Pois bem, o surgimento de tudo, sem que houvesse algo que lhe precedesse, é o que se chama surgir do nada, sem razão e nem propósito. Isto é perfeitamente admissível e é uma explicação muito mais plausível do que a suposição da interveniência de um agente extra-natural. A alternativa é de que tudo sempre existiu, mesmo que de outra forma. Se surgir do nada é difícil de se admitir, eternidade passada também o é.
Os números naturais, pares, ímpares, inteiros e racionais têm cardinalidade alef 0. Os reais e suas ênuplas, como os complexos e os quaternions, bem como seus abertos, além das matrizes, tensores e formas diferenciais numéricas, têm cardinalidade alef 1. O espaço das funções e dos funcionais, das matrizes, tensores e formas funcionais, tem cardinalidade alef 2. O conjunto potência do conjuto das funções (o conjunto de seus subconjuntos) tem cardinalidade alef 3, e assim por diante. O conjunto das possíveis ocorrências, como é o conjunto dos subconjuntos de ênuplas de números reais, tem cardinalidade alef 2, e portanto não pode haver uma função bijetora de domínio real que o tenha como contradomínio. Assim nem num tempo infinito em um espaço infinito (tetradas de números reais) seria possível que se dessem todas as ocorrências passiveis de se ter com os sub-sistemas do Universo.
Por consideração de que o presente atual ainda não existia em momentos passados que temos na memória, podemos inferir que haverão momentos futuros. Então, de nossa percepção e do cotejo das percepções de outros sujeitos, pode-se ver que existe algo objetivamente fora de mim, que é a sucessão de eventos a que chamamos tempo, e que ela prosseguirá além do presente momento. De fato, toda percepção que tenho da ocorrência de eventos fora de minha mente é a de eventos que já ocorreram, pois a informação sobre eles chega a mim com uma velocidade finita (no máximo a da luz). Na verdade a coordenatização do tempo pode ser feita em uma semi-reta apontada para o passado, cuja origem sempre está colocada no momento presente e que, continuamente, é acrescida dos momentos imediatamente transferidos para o passado. Pode ser que ela se extenda indefinidamente ou que seja um segmento com um ponto terminal no instante em que o tempo passou a existir. O que precisa ficar claro, contudo, é que essa sucessão existe independente de observadores que a contemplem. Isto é, mesmo que não hajam consciências para perceber o tempo, seu fluxo se dá do mesmo modo. Outra coisa é que não há meios de se definir, para todos os referenciais, uma única superfície (de Cauchy, se pensarmos em condições de contorno para equações diferenciais) global que seja o lugar geométrico de todos os eventos (pontos do espaço-tempo) situados no mesmo instante, por exemplo, o presente. Isto é, o que é presente para mim pode estar no futuro ou no passado de outro observador que se mova em relação a mim.
O conteúdo substancial básico do Universo é simplesmente um vasto campo, que preenche todo o vácuo (não existe vazio no Universo). Este campo, primordialmente indiferenciado, fez surgir, em suas flutuações, pares de partículas e anti-partículas, que são suas quantizações. Ao se aniquilarem elas produziam fótons (que são suas próprias anti-partículas), que consistem na radiação de fundo, até hoje observada. Como a densidade de energia do campo era grande, híperons se formaram. Como há uma assimetria na meia-vida da matéria e da antimatéria, pelo decaimento, alguma matéria não foi aniquilada e constitui tudo o que sobrou. Assim, tanto a matéria (férmions, isto é, quarks e leptons) como a radiação são provenientes desse campo do vácuo, que ainda existe mas já não é indiferenciado, estando principalmente na forma de fótons virtuais (campo elétrico) e os outros campos. O gravitacional, contudo, resiste às tentativas de unificação (a não ser que a teoria M seja comprovada, ou a teoria dos laços quânticos), e me parece que ele seja realmente dado pela geometria do espaço-tempo, não se constituindo em uma interação mediada por campo.

Espiritualidade Ateísta

Como já o disse em muitas ocasiões, grande parte das discussões filosóficas se prende ao entendimento de conceitos. Talvez adversários estejam falando a mesma coisa com entendimentos conceituais diferentes. Quando afirmo que sou ateu (na modalidade cética e não dogmática) não estou dizendo que sou materialista, nem que não valorizo a espiritualidade e nem que não me paute por princípios transcendentes e éticos. Mas o que entendo por estes conceitos? O ateísmo é simplesmente a consideração de que não existem entidades reais a que se possa aplicar o conceito do que se entende por Deus, isto é, um ser de natureza não física (mas é preciso entender que físico não se restringe a material), dotado de percepção global de toda ocorrência, inteligência, volição e capacidade de atuar sobre a natureza segundo seu desejo, à revelia do comportamento normal dela. Acessoriamente este ser também poderia ser possuidor de outros atributos, como justiça e bondade, mas se não os possuir, não deixaria de ser Deus. Paralelamente à negação da existência de tais tipo de seres, o ateu também não considera que exista qualquer tipo de realidade sobrenatural, como alma imortal, anjos, demônios ou outra modalidade de espíritos. Que resta, então? Só a matéria? Claro que não!
A realidade natural, além da matéria é composta de campos, radiação, espaço, tempo, de estruturas formadas por essas entidades, da dinâmica dessas estruturas, das leis que esta dinâmica segue e, o que é relevante para nossas considerações, de um tipo de entidade que eu denomino “ocorrências”. Tal é a categoria em que se enquadra a mente com todos os seus atributos, como a memória, o pensamento, o raciocínio, a emoção, os sentimentos, os instintos, a intuição, a consciência e o “eu”. Tal ocorrência não é material, mas para que se dê requer um substrato material, que, por enquanto reside em organismos biológicos, como o sistema nervoso humano e de outros animais superiores. Mas pode vir a ser implementada em artefatos eletrônicos.
Assim, não faz sentido a concepção de uma “consciência cósmica”, uma vez que a totalidade do Universo não possui conexões ágeis o suficiente para permitir a concretização desse tipo de ocorrência.
Mas a realidade (entendida como sendo aquilo que existe), além disso, também é formada por outras categorias. Quero mencionar as categorias dos conceitos (ou idéias), dos valores e das normas. Tais categorias não se referem a seres nem coisas mas a abstrações cuja existência surge nas mentes que as concebem. Todavia não são registros particulares das mentes de cada sujeito, mas algo que se torna objetivo (isto é, existente fora das mentes) por um processo de consenso inter-subjetivo, isto é, de aceitação pela coletividade das mentes. A realidade das idéias não é uma realidade “real” da natureza, bem como a dos valores e das normas. Sua existência depende da existência de seres reais que possuam mentes e seria inteiramente desfeita no momento em que nenhuma mente mais existisse. Enquanto as idéias são de natureza intelectiva, os valores e as normas, mesmo que possuindo um entendimento do intelecto, são de natureza afetiva e volitiva. E, dentre os valores, como os de ordem estética, pragmática ou outras, sobressaem os deontológicos ou éticos, que se reportam às qualidades das ações em serem boas ou más, certas ou erradas, justas ou injustas, verdadeiras ou falsas, honestas ou desonestas etc.
Toda esta categorização pode perfeitamente ser feita, e o é, sem a mínima menção à existência de realidades sobrenaturais, como Deus. São valores pertinentes a qualquer ser sensiente e consciente, como os humanos ou outros que haja.
Deste modo o conceito de transcedente não se refere a nada que ultrapasse a realidade, assim concebida, isto é, que seja de origem sobrenatural. Transcedente é a qualidade daquilo que não se prende ao atendimento das necessidades imediatas de sobrevivência do organismo e da espécie, que são ar, água, alimento, abrigo, segurança, sexo e outras que tais. Uma vez que isto seja satisfeito, os seres conscientes buscam satisfazer necessidades de ordem mais elevada, como gozar de paz e alegria, sentir-se respeitado, reconhecido e amado, fruir de prazeres estéticos e da sensação de satisfação consigo mesmo por estar vivendo e agindo de acordo com o que seja certo, justo e bom. Transcedência é pois a qualidade daquilo que vai além das necessidades comezinhas ou mesmo da satisfação dos prazeres meramente sensoriais, como o alimento saboroso ou o sexo prazeroso (o que não é algo condenável). Transcedental é filosofar, amar o bem e a justiça ou ser caridoso, por exemplo.
E espiritualidade? Pode-se concebê-la sem considerar que existam espíritos nem almas? Claro que sim! Espiritualidade é uma atitude, um modo de ser, de quem pensa, sente a age de acordo com princípios mais elevados que não apenas o intuito de levar vantagem, de quem é altruísta, de quem se compraz em fazer o bem, em buscar a sabedoria. De quem experimenta um sentimento de enlevo na contemplação da beleza e sempre considera tudo pelo lado positivo e benevolente. Não vejo que tal modo de vida seja necessariamente associado à crença na existência de Deus, mesmo que possa o ser. Ateus podem ser altamente espiritualizados, altruístas e magnânimos, do mesmo modo que crentes podem ser extremamente materialistas, egoístas e mesquinhos.

Surgimento incausado do Universo

É razoável supor que exista vida extra-terrestre sim, apesar de rara, mesmo que não possamos garantir. Tampouco se deve ater apenas ao que já é conhecido. Muita coisa pode ainda ser descoberta, alíás, muito mais do que o que já se sabe.
Quanto à causalidade, considerar que tudo tenha que ter uma causa é que é se fechar no que já está conhecido e não dar abertura para outras possibilidades. Tanto pode ser que eventos para os quais não se identificam causas as tenham ainda não detectadas como não as tenham. A diferença entre condição e causa é grande. Condição é uma situação que possibilita a ocorrência de algo, mas não a determina, enquanto causa a determina. Todo evento se dá sob certas condições mas pode ocorrer sem que nada o determine. Assim é o decaimento radioativo e o decaimento de átomos excitados. Como se sabe que não há algo que o determine? Porque o tempo de espera para algum decaimento individual é inteiramente aleatório, estando os sistemas exatamente nas mesmas condições e nada diferente tendo ocorrido. Se se descobrir algum evento até agora oculto que seja determinante do decaimento, muda-se a concepção, mas, por ora, o razoável é considerar que se trata de um evento incausado (mas condicionado).
A questão maior então passa a ser a seguinte: poderia se ter a ocorrência de um evento sem condição prévia alguma? Esta situação é a que se apresenta quando se pensa ter o Universo surgido a partir de nada e sem um agente interventor desencadeado seu surgimento (neste caso chamado de “criação”). Até o momento, nas condições de existência do Universo, tal coisa não se apresenta. Mesmo o surgimento de pares de partícula e anti-partícula, apesar de incausado, ocorre sob a condição de se estar no vácuo, que não é vazio, mas preenchido por um campo (mar de partículas virtuais) que tem energia, da qual essas partículas formam sua massa. Isto é, elas não surgem “do nada” e nem “do vazio”, mas “do vácuo” (é preciso distinguir bem esses conceitos que, muitas vezes, são usados inadequadamente).
A viabilização dessa possibilidade se apresenta quando se vê que “nada” significa a ausência total de tudo, isto é, de matéria, de radiação, de campos, de vácuo, de vazio, de espaço, de tempo e também, “eureka”, de qualquer tipo de lei a que alguma coisa tenha que se submeter. Portanto, o surgimento de algo a partir de coisa alguma, se realmente não se tem nada, não é impedido por prescrição nenhuma. Tudo pode acontecer a partir do nada, inclusive o surgimento de tudo o que existe. Note que este é um evento singular. Uma vez que esse surgimento tenha se dado, já se está em condições em que existe algo e esse algo que existe passa a seguir certas regras (que são as leis físicas), regras essas que podem inviabilizar algumas ocorrências que violem leis de conservação (da energia, por exemplo). Mas esta lei não existe se nada existe. Então o surgimento de tudo não a viola.
Tomar emprestado de lugar nenhum é simplesmente uma modo eufemístico de dizer que é possível haver o surgimento seguido do desaparecimento imediato de valores de energia que não possuam fonte, isto é, “surgem do nada”.
Aliás, penso eu agora, esta poderia ser uma possibilidade para o surgimento do “ovo primordial” que deu origem à expansão do Universo, como uma quantização, não do vácuo, que não existia (e não é vazio), mas do “nada” mesmo, desde que a subita expansão (inflação) que se seguiu tenha se dado em um tempo menor do que o requerido na expressão da relação de incerteza. Mas isto é só uma conjectura. Vou fazer as contas. Mas é preciso entender que esta “quantização” não é uma ocorrência que se dê com algo pré-existente, como ocorre atualmente com o vácuo, mas um surgimento que não provenha de coisa alguma.
O nada jocaxiano é simplesmente, “nada”. Mas se você pensar bem,a inexistência de qualquer coisa também implica a inexistência de qualquer proibição, isto é, de leis de conservação. Então você pode entender o nada como sendo a sede de todas as possibilidades. Mas elas não têm existência no nada (que não é algo). Quando se concebe um “tudo” potencial, em que qualquer coisa está presente “em potência” e, por uma flutuação aleatória, transforma-se em “algo”, isto é, na totalidade do que existe, está se dando um caráter entitativo a esse “tudo”. Não é preciso isto. Qualquer coisa pode surgir sem ter vindo de coisa alguma. Não há esse impedimento, se não se tem nada. Havendo algo, então há leis de conservação, mas, do nada, tudo pode surgir, sem razão, causa, motivo, finalidade, propósito. À toa mesmo. Mas só tudo de uma vez. E porque este tudo que está aí e não outro? Porque calhou de ser este, e não outro. Só isto.
Outra coisa. Enquanto não havia nada, não passava tempo. Não ficou um tempo infinito sendo nada. Não ficou tempo nenhum. Quando surgiu tudo, surgiu também o tempo e o espaço para caber tudo. Se não há nada, não há espaço vazio também não.
Condição não é o que possibilita o fato que determine um evento mas que possibilita sua ocorrência, mesmo que não determinada por nada. Átomos não excitados não têm condição de decair, por mais que algo o determine. Mas excitados podem decair, ou porque algo o determine ou sem nada que o determine. Eu não preciso provar que isto pode ocorrer. Isto é uma inversão de ônus de prova. Se se diz que todo evento precisa de ter uma causa é isto que tem que ser provado, caso contrário se supõe que não seja preciso. E porque seria preciso? Por que sempre se observa? Isto não garante nada. A causalidade se aplica a um grande número de casos, mas são sempre fenômenos complexos, isto é, que envolvem sistema de muitas entidades elementares. Os fenômenos que ocorrem com as próprias entidades elementares isoladas muitas vezes não são efeitos. São fortuitos. A introdução de variáveis ocultas é gratuita e semelhante à fábula do dragão da garagem.
A singularidade prevista nos modelos cosmológicos que contemplam o Big bang, nunca existiu na realidade, pois, nas condições de sua vizinhança, as hipóteses em que as teorias se fundamentam não são preenchidas. Portanto a extrapolação de uma região de altíssima densidade para um ponto de densidade infinita não é suportada pelas teorias do Big bang, que apenas descrevem a evolução da expansão do Universo a partir de um certo tempo de existência (extremamente pequeno, mas não nulo). A formação dessa concentração de campo, que continha tudo o que existe enormemente concentrado, não é explicada por nenhuma teoria física hoje existente. Isto não significa que não se tenha, mas também não significa que a explicação se deva à interveniência de alguma entidade extrínseca ao Universo. A possibilidade de que tenha surgido “do nada” não é descartada por nenhuma consideração teórica da Física e nem da Filosofia.
A singularidade prevista nos modelos cosmológicos que contemplam o Big bang, nunca existiu na realidade, pois, nas condições de sua vizinhança, as hipóteses em que as teorias se fundamentam não são preenchidas. Portanto a extrapolação de uma região de altíssima densidade para um ponto de densidade infinita não é suportada pelas teorias do Big bang, que apenas descrevem a evolução da expansão do Universo a partir de um certo tempo de existência (extremamente pequeno, mas não nulo). A formação dessa concentração de campo, que continha tudo o que existe enormemente concentrado, não é explicada por nenhuma teoria física hoje existente. Isto não significa que não se tenha, mas também não significa que a explicação se deva à interveniência de alguma entidade extrínseca ao Universo. A possibilidade de que tenha surgido “do nada” não é descartada por nenhuma consideração teórica da Física e nem da Filosofia.

Esoterismo quântico

Concordo de que o Universo constitui-se de um único e vasto “campo” que aqui e acolá se concentra em partículas (suas “quantizações”) cujos conglomerados formam a matéria (os férmions) e a radiação (os bósons), o restante sendo o próprio campo, que é um “mar” de partículas virtuais. Energia, contudo, não é um constituinte do Universo, mas sim um atributo de seus constituintes. Todo ele, portanto, está interligado, sendo qualquer sistema, na verdade, um “sub-sistema” do todo, do qual é indissociável. Isto contudo não atribui a esse todo nenhuma mente, consciência ou inteligência. Estes atributos pertencem a sub-conjuntos providos de estrutura e dinâmica tais que os possibilitem a sediar tais tipos de ocorrências, como é o caso do organismo humano vivo e saudável e outros ainda, até mesmo artefatos artificiais que venham a ser construídos.
Quanto à natureza da realidade, é realmente preciso rejeitar qualquer rotulação dogmática, como o positivismo e o empirismo. A Ciência e a Filosofia precisam se despir de adjetivos. Mas a ciência tem a pretensão legítima de compreender a realidade, mesmo que saiba que pode ser que isto seja impossível em sua totalidade. Mas, abordagens cada vez mais próximas devem ser empreendidas. Contudo, muito do que se considera desvendado pela Física Quântica, numa abordagem que denomino de “Esoterismo Quântico”, especialmente levada a cabo por Fritjof Capra e Amit Goswami, não possuem fundamento científico algum. Tratam-se de tentativas de hibridação de conhecimentos científicos com crenças mitológicas hinduístas, fundamentadas em interpretações análogas que as duas correntes apresentam em alguns aspectos. Isto, contudo, não valida as justificativas dos fundamentos mitológicos das analogias e nem permite sua extrapolação para casos em que nem analogias se verificam. Por exemplo: é verdade que a Física Quântica trata de possibilidades com suas probabilidades e que, na observação, se manifesta uma delas. Mas nada na Física Quântica diz que é a consciência do observador que determina.
A assertiva de que o Universo como um todo possua (e não “seja”) uma inteligência é semelhante à que afirma existir uma entidade extrínseca ao Universo, dotada de inteligência, que o criou e o provê (Deus). Não há como comprovar indubitavelmente que sim e nem que não. Portanto, uma vez que isto não é evidente, a hipótese fundamental é a de que não exista, sendo requerida prova de existência e não de inexistência. Como não há esta prova, suponho a inexistência (de ambas). Mesmo sem prova, são grandes os indícios no sentido da inexistência dessa inteligência, entendido que seja o que isto signifique. Como inteligência é uma capacidade de agir segundo um plano e não apenas por respostas reativas a estímulos ou iniciativas incausadas aleatórias, sua existência seria verificada se se conseguir identificar tal tipo de ocorrência. Pelo que se pode observar da evolução cósmica e do comportamento dos elementos da natureza, nada disso se dá. Apenas os organismo suficientemente complexos em sua estrutura e dinâmica são capazes de exibir tal tipo de comportamento. A evolução do Universo não mostra ter seguido nenhum plano, nem mesmo a evolução biológica, que repousa em dois fatores, mutação e seleção, a primeira sendo inteiramente aleatória e a segunda uma reação aos fatores ambientais externos e internos ao organismo. Nada indica um projeto para levar a algum resultado. Só agora, com a engenharia genética, o ser humano será capaz de projetar e fabricar um organismo vivo segundo suas prescrições.
Não há nenhuma exigência de que o observador que, ao interagir com algum sistema, faça com que ele se coloque em um dos auto-estados do operador correspondente à grandeza que esteja sendo observada e exiba o auto-valor correspondente, seja inteligente e possua consciência. Isto não faz parte da Mecânica Quântica. Pode ser qualquer coisa que registre o valor da grandeza: um instrumento de medida artificial. Não é requerida consciência.
Certamente que, numa observação por instrumento, se não houve uma inteligência que programou o instrumento e depois foi coletar os resultados, a medida não trouxe resultado algum, em termos de conhecimento. Mas no que diz respeito à mecânica quântica, o sistema observado caiu no auto-estado do auto-valor correspondente ao valor detectado pelo medidor, independente de que esse resultado venha a ser conhecido por alguma consciência ou não. Além disso, na própria natureza inanimada, sempre que um sistema interage com outro e, nessa interação, troca algum atributo, como energia, o valor trocado funciona como um valor medido para todos os efeitos quânticos, e isto não tem nada a ver com inteligência e consciência.

Muitos consideram um observador universal extrínseco ao Universo, isto é, Deus. A noção de que seja o próprio Universo é mais palatável, desde que se entenda que, em Mecânica Quântica, não se requer que o observador seja uma entidade consciente. Neste caso pode-se conceber que a revelação do estado quântico de algum subsistema do Universo, bem como dos valores de seus atributos, como energia, carga, spin etc., se dá quando ele interage com sua vizinhança (o resto do Universo), que funciona como observador. Isto pode explicar a questão. Contudo, a noção de que o próprio Universo seja uma inteligência gestora de si mesmo, que é o panteísmo, requer verificações sobre as características do comportamento global do Universo, para ver se apresenta traços de inteligência.
Até o momento não consegui ver que os fenômenos EPR, Escolha de Wheeler, Tunelamento, Salto, Efeito Zeno e Efeito Frolich indicam a existência de uma inteligência cósmica. Admiro a perseverança de quem busca uma explicação científica que justifique sua fé na existência de Deus, mas fico com William of Ockham, que mostrou que a razão (ou a ciência) não conseguem provar que Deus existe. Mas ele manteve a fé assim mesmo.
Também considero que a função de onda seja uma entidade real: o campo imaterial de que o Amit Goswami fala. Todo campo, elétrico, magnético, forte, fraco e os campos da matéria bariônica e leptônica são imateriais. Mas são físicos (naturais) e não possuem inteligência alguma. As partículas da matéria (férmions) e as mensageiras das interações (bósons) são quantizações de seus respectivos campos, que, no princípio, era indiferenciado.
Todavia esse campo existe no espaço e no tempo. Sempre que alguma entidade física exista, ela ocupa espaço e existe ao longo do tempo. Tanto não há espaço e tempo sem que algo os preencha quanto não há coisa alguma, mesmo virtual (no sentido físico e não informático do termo) que não ocupe espaço e exista no tempo, exceto as abstrações. Mas as abstrações não são reais, são idéias, construtos mentais, conceitos que só existem como ocorrências dentro de uma mente. Não existem em si mesmas, independente de alguma mente.
Dir-se ia, então, que esse campo imaterial seria uma abstração de uma mente cósmica. Uma abstração, contudo, não se torna uma realidade física nem espiritual, pelo que me consta, e, uma mente é uma ocorrência que se dá em algum sistema existente.
Como poderia ser uma mente puramente abstrata?
Além do mais, abstrações não possuem localização espacial, como o pensamento. Ele se dá como uma ocorrência no cérebro, mas ele não “está” no cérebro nem em localização espacial nenhuma. Seria o caso de Deus, se existisse, conforme o conceito de se tem dele. Ele não “está” em todo lugar, simplesmente que, por ser espírito, não ocupa lugar.
Gostaria de ver as comprovações de tudo o que se tem dito sobre o campo imaterial (conforme o concebe Amit Goswami). Para mim, simplesmente, não existe campo universal consciente nenhum. Mas, supondo que exista, de onde se conclui que possua todas as propriedades descritas: imaterial, abstrato, virtual, onipresente, não se submete aos limites do espaço e do tempo, suas ações violam as desigualdades de Bell e a Relatividade Restrira, ocorrem acima da velocidade da luz e até mesmo contra a seta do tempo, é o fator causal do mundo material?
Mais ainda: Porque alguma coisa existente, mas imaterial teve que ser o fator causal do Universo? Porque, pelo fato de ter surgido, o Universo tem que ter causa? Porque somente o que é eterno e não surge, dispensa causa? E porque o Universo não poderia ser eterno e não ter causa?

Utopia anarquista

Sim, esta UTOPIA é o mundo que eu almejo que se torne realidade e envido todos os meus esforços nesse sentido. É o anarquismo, a sociedade ácrata, sem governo, sem fronteiras, sem dinheiro, sem propriedade, sem crimes. Isto é perfeitamente possível e tenho a convição que esta é a tendência da humanidade e que chegaremos a esse estágio talvez em menos de mil anos. Mas podemos abreviar esse tempo por ações positivas, principalmente na educação e no exemplo. Exemplo de trabalhar de graça pelos outros, de doar os seus bens e se tornar despossuído, de organizar voluntariados para empreendimentos comunitários. Volto mais tarde para prosseguir a desenvolver essas idéias anarquistas.
Sim, o dinheiro é um veículo de troca, e nada mais. Não tem valor em si mesmo. Mas é inteiramente dispensável se pensarmos na Economia como os processos de produção e distribuição dos bens em si mesmos. Mas não em troca. Nem se trata de escambo. Cada um produz tudo o que for capaz e cada um consome o que necessitar. Mas de modo espontâneo e não controlado pelo governo como ocorreu com os países ditos comunistas, que simplesmente trocaram a tirania da aristocracia pela tirania da burocracia partidária. Mas o povo continuou sem liberdade. Os regimes comunistas caíram porque exatamente não eram comunistas coisa nenhuma. Eram ditaduras e nem do proletariado. O capitalismo é um sistema econômico natural. Se deixarmos todos por sua conta, sem imposições, surgirá o capitalismo. Só que pode haver exploração dos mais fracos (em qualquer sentido) pelos mais fortes. Mas se um grupo atuante puder convencer, pela educação e pelo exemplo, de que a felicidade será maximizada quando todos participarem das riquezas (em termos de bens e não de dinheiro), então será possível pulverizar o capitalismo de tal forma (transformando todos em patrões) que, a certo momento, o dinheiro perderá a razão de existir, como ocorreu com a URV no plano real. Como não tem sentido haver um partido anarquista, pessoas anarquistas se candidatariam a cargos legislativos por qualquer partido e proporiam leis que, ao longo do tempo, promoveriam a participação dos empregados no capital das empresas, até que tal coisa ocorresse. Levariam poucos séculos.
Certamente que é preciso haver coordenações de esforços e coibições de preguiçosos e aproveitadores. Anarquismo não significa desordem, em absoluto. Pelo contrário. Significa, inclusive, um sistema altamente organizado, porque orgânico, isto é, a ordem ocorre de dentro para fora, por uma constatação de sua necessidade, sem imposição. Outra característica do anarquismo que pode começar a ser implantada desde jé é o comunitarismo. Isto é: não haver residências particulares, mas sim, hospedarias coletivas, lavanderias coletivas, refeitórios coletivos, vestuários coletivos, locais de lazer coletivos, agrupados por regiões a cada mil pessoas, por exemplo. Com postos de saúde e tudo que for preciso. Assim ninguém precisa possuir nada de seu, nem roupas, nem carros, nem motos, nem televisores, nem geladeiras, nem louça, nem talheres, nada mesmo. Tudo é de todo mundo e nada é de ninguém. Nem as mulheres, nem os maridos. Todo homem o é de toda mulher e toda mulher o é de todo homem. E toda criança é filha de todo adulto e todo adulto é pai e mãe de toda criança. Não havendo propriedade (nem do cônjuge) não há quase motivo nenhum para qualquer crime. Para que roubar aquilo que já se tem? Estas iniciativas já podem começar a serem implementadas em bairros, com creches, hortas, quadras de esportes etc. Mas nada feito pelo governo e sim pelas próprias pessoas, que cedem seu tempo para trabalhar de graça na construção e na manutenção, que doam os materiais. Tudo sem contabilidade, sem registro, sem formalidades legais. Espontâneo. Assim, daí a um certo tempo, o governo se tornará dispensável.
Uma das perversidades da existência do dinheiro é a criação de desigualdades artificiais pelo escalonamento do grau de riqueza material, expressa pelo quanto de dinheiro se possui. Desigualdades naturais as há, quanto à inteligência, beleza, saúde, temperamento, estatura, peso, etnia etc. Outras são socialmente impostas e precisam ser abolidas. Religião, por exemplo. Ninguém nasce tendo nenhuma religião mas a sociedade (a própria família) impinge uma à criança, o que lhe estigmatiza perante outras. A etnia, por exemplo, mesmo sendo uma desigualdade natural, só passa a ser motivo de preconceito quando a sociedade lhe confere esse tipo de valor. Uma sociedade anarquista é completamente igualitária, principalmente quanto à riqueza. Todos são igualmente ricos, pois todos possuem tudo. E todos são igualmente pobres, pois ninguém possui nada. Esta é a beleza maior do anarquismo: a liberdade, a igualdade e a fraternidade totais e globais. Mas não se tem a liberdade de ser intolerante ou tolher a liberdade alheia. A sociedade desenvolverá mecanismos de coibir a intolerância, a preguiça, a malandragem, a esperteza desleal e qualquer vício, sem que seja preciso haver polícia nem prisões. Assim muitas profissões se tornarão inúteis, como bancários, advogados, juízes, contadores e muitas outras. Com a coletivização de tudo, o tempo de lazer aumentará tremendamente, bem como a economia de recursos de toda ordem para se fazer qualquer coisa. É o verdadeiro paraíso na Terra. Mas só pode existir se for em nível de abrangência mundial. Não é possível haver um estado anarquista e só se podem abolir os estados se não houver nenhum. Países sim, com sua diversidade cultural e linguística. Mas não governos, nem estados, nem fronteiras. Religiões até pode haver, desde que todas tolerem umas às outras e não restrinjam liberdade alguma das pessoas, exceto a de coibir a liberdade alheia ou ações malévolas. A ética prevalece, entendendo por ética uma conduta maximizante da felicidade.
Uma das atitudes anárquicas mais louváveis que já temos é a da formulação dos softwares livres, distribuídos gratuitamente, como l Linux. Eles não possuem autor. São construções coletivas. Outra é a Wikipedia. Ou os livros disponibilizados gratuitamente como e-books. E músicas também. A internet é uma grande rede anárquica e é fabulosa. É preciso que comecemos a tomar iniciativas desse tipo em nossa comunidade. Isto é, que dispendamos parte do nosso tempo trabalhando de graça para benefício coletivo. Dando aulas de graça. Compartilhando nossa casa, nossos livros e outras coisas com os outros. E convencendo a todos a agir assim. Consertando os buracos da rua por nossa conta. Deixar o governo de lado cada vez mais e fazer tudo o que for possível por iniciativa própria coletiva e sem ônus para ninguém. Procurar aumentar a economia informal o máximo possível. Quanto mais isto for disseminado mais vai sendo desnecessário a existência de governo, até que ele caia de maduro, por não arrecadar mais imposto algum e não ter nada mais que fazer.

Eternidade e Infinitude do Universo

Sobre a eternidade e a infinitude do Universo, eu não acredito nem deixo de acreditar. O conhecimento que tenho a respeito diz-me que todas as opções são possíveis. Tanto que ele tenha sempre existido quanto surgido num momento. Tanto que perdure eternamente quanto venha a inexistir (juntamente com o tempo e o espaço). Tanto que se estenda infinitamente como tenha uma dimensão limitada. O que dará a resposta sobre qual possibilidade é a que ocorre de fato, não é o que eu ou qualquer pessoa ache, mas o que as conclusões advindas dos resultados observacionais indicarão. Pelos valores atualmente disponíveis e segundo o modelo teórico aceito pela maior parte da comunidade científica, o Universo teve um momento inicial, se estende indefinidamente no espaço e perdurará eternamente. Mas não há garantia de que esta seja a verdade. Novas evidências podem derrubar o modelo padrão da cosmologia ou, mesmo nele, alterar os parâmetros que indicam a finitude ou infinitude do tempo e do espaço. Tudo está em fase de investigação. A Cosmologia é uma ciência jovem. Muitos dados são desconhecidos e ainda não há um consenso universal forte sobre os vários modelos teóricos, além de existir grande imbricação da Cosmologia com a Física de Partículas e as Teorias Quânticas de Campo. Temos de dar tempo ao tempo para ver como ficam as coisas. E esse tempo pode ser até de centenas de anos ou mais. O que não se pode é admitir como verdades, opiniões fundamentadas em conhecimentos puramente mitológicos ou pretensas revelações. Só a investigação metodológica pode levar a uma aproximação maior da verdade.
Se o Universo teve um início, então, nesse momento, começou a existir tudo o que há: o espaço, o tempo, o conteúdo que o preenche, a estrutura espacial desse conteúdo, sua dinâmica temporal e as leis que descrevem como isso ocorre. O conteúdo, que é o mesmo até hoje, apenas com alterações em sua forma de apresentação, é, simplesmente, algo que se denomina “campo”. Nos primeiros instantes ele era indiferenciado, mas com a expansão e o resfriamento resultante, começou a manifestar-se em suas diferentes formas: campo da matéria bariônica e leptônica e das interações forte, fraca e eletromagnética. Logo então passou a exibir quantizações, isto é, concentrações, que são as partículas constituintes da matéria (quarks e léptons) e as mediadoras das interações (fótons, glúons, W e Z) e suas respectivas antipartículas, a princípio em número igual. O campo em si mesmo é, pois, um “mar” de potenciais partículas e antipartículas. Mal se formam, elas se aniquilam com sua antipartícula, liberando fótons, que não o fazem por serem sua própria antipartícula. Mas, com o aumento do caminho médio livre, tornou-se possível haver decaimento radioativo beta antes do aniquilamento e, como a meia-vida da matéria é diferente da antimatéria, partículas não mais encontravam suas antipartículas para se aniquilar, resultando numa sobra de partículas, o resto ficando como a radiação de fundo (fótons). Quanto à gravitação, possivelmente ela não é uma interação, mas uma manifestação da inércia num espaço-tempo encurvado.
Mas, e essa concentração primordial de campo que iniciou a expansão, como surgiu?
Duas hipóteses: não surgiu, isto é, existia previamente ou surgiu “do nada”. As duas são plausíveis e, em ambas, antes que a expansão começasse, como o estado do Universo era inexistente ou imutável, não decorria tempo, e, logo, não existe “antes” do início do Universo, caso ele tenha iniciado.
Se o Universo vier a se acabar, várias possibilidades se apresentam. A primeira é a morte térmica, em que, com a expansão, todos seus subsistemas estarão no nível mínimo de energia e a entropia total terá atingido seu máximo valor, não sendo mais possível nenhuma mudança de estado, ficando tudo no zero absoluto. Então, a inexistência de qualquer alteração implicará na cessação da passagem do tempo, que será atingida de uma forma assintótica.
Outra possibilidade é a do término da expansão e a passagem para uma contração, que se daria até que tudo voltasse ao estado primordial de densidade elevadíssima. Daí é possível que volte a haver expansão ou não, permanecendo tal como ficou, sem alteração. A ausência de alterações também significa o fim da passagem do tempo. Mas, se o Universo voltar a expandir, então é possível que a presente expansão também seja o seguimento de uma contração anterior, e isto seja uma série de ciclos infindável, tanto para o passado quanto para o futuro. Neste caso, o Universo seria eterno nos dois sentidos.
Se a expansão se acelerar, é possível que sua rapidez passe a rasgar a própria estrutura do espaço, destruindo-o e aniquilando o Universo, por não haver mais espaço, que é um constituinte essencial. O tempo também deixaria de existir, bem como o conteúdo.
Finalmente é possível que, do mesmo modo que o campo primordial possa ter surgido, de repente, do nada, tudo o que existe, de repente, por acaso, deixe de existir, não restando nada, nem conteúdo, nem espaço, nem tempo e nem Universo.
Todas essas possibilidade podem ser verificadas pela análise dos dados observacionais, dentro dos modelos teóricos existentes, exceto a última.
Os dados atuais, contudo, não indicam que o Universo venha a deixar de existir nunca. Mas se deixar, da mesma forma que não existe “antes” do início, também não existirá “depois” do fim.
Se o Universo for finito, o espaço não pode ser euclidiano. O modelo mais simples para um espaço finito é o de uma superfície esférica tridimensional imersa em um espaço quadridimensional (que não é o espaço-tempo da relatividade, mas sim uma abstração matemática). Este espaço, apesar de ser limitado, não tem fronteira, da mesma forma que uma superfície esférica bidimensional imersa em um espaço tridimensional, como a superfície da Terra. Se alguém sair voando sobre a Terra, na atmosfera, ficará dando voltas em torno dela sem nunca encontrar uma fronteira. Mas a superfície não é infinita. Do mesmo modo, em um Universo finito, quem andar sempre para frente, ficara dando voltas, sem nunca encontrar uma parede. Todo o espaço existente estará no Universo. Não há nada depois dele nem fora dele. Nem galáxias, nem radiação, nem mesmo espaço vazio. Trata-se de um “não lugar”, isto é, não há possibilidade de se estar fora do Universo. Isto não existe, mesmo que o Universo seja finito. O Universo não é um conjunto de coisas que ocupa certa região de um espaço infinito. Todo o espaço existente faz parte do Universo. E não existe espaço que não tenha conteúdo. Não existe vazio no Universo. Isto é uma impossibilidade. Pode haver vácuo, mas vácuo não é vazio. Tem campos e radiação. Só não tem matéria. Nada também não existe. Se você encostar o polegar contra o indicador, o que há entre eles? Nada! (pode sobrar um ar residual, mas suponhamos que não sobre). Não há matéria, nem radiação, nem campos, nem espaço vazio para caber alguma coisa. Isto é nada, na frente dos seus olhos. Fora do Universo não há nada. Nem espaço vazio para caber algo.

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