Primeiramente a falta de rigor filosófico. Mas isto é secundário. Nem sempre o rigor é acompanhado da validade. Tomás de Aquino, Kant e Heidegger foram rigorosos, cada qual defendendo posições distintas. NIetzsche era literário, o que, realmente, lhe dá um certo charme. Acho que seria boa uma síntese dialética do rigor com a literatura na Filosofia. Bertrand Russell conseguiu isto.
Mas o que importa é a validade das propostas. Nisto Nietzsche peca por atirar a torto e a direito, muitas vezes em moinhos de vento. Concordo plenamente com sua oposição à religião como instrumento de dominação mental e castradora da expressão criativa do homem. Inclusive com sua crítica a Sócrates e Platão ao introduzirem noções éticas, estéticas, epistemológicas e metafísicas inadequadas ao bom filosofar. Há pontos que reputo grandes equívocos de Nietzsche e que são considerados os pontos fortes de seu pensamento.
O primeiro é o do "eterno retorno". Nada mais idiota e sem fundamento em fatos. Uma opinião completamente sem base. Não há retorno de coisa nenhuma. O fluxo dos acontecimentos segue sempre para frente sem repetir-se, exceto excepcionalmente. Podem haver componentes cíclicas de comportamentos em certos períodos limitados, como se dá com a moda, por exemplo. Mas apenas em intervalos curtos. Não há retorno à moda de mil anos atrás. Ele considerava que o Universo tinha que ser eterno para o passado, já que não há Deus para criá-lo e não pode surgir do nada. Errado! Pode surgir sem prover de coisa alguma sim.
Outro equívoco é a "vontade de potência", como fator propulsor das ações humanas. Isto é falso, pelo menos como um princípio. A vida é impulsionada pela "vontade de viver" como considerou Schopenhauer. Mas isto também não é propriamente uma "vontade". É simplesmente o que acontece sem razão de ser nenhuma. A estrutura da vida surgiu de forma a se replicar e perpetuar e faz isto sem razão nem propósito. Todo o organismo surgiu para perpetuar a vida, mas não com esse objetivo. As ações dos seres vivos se dirigem para a procriação e a sobrevivência, mas não porque este é o objetivo e sim porque é isso o que se dá. Nenhum ser pretende exercer poder sobre nada. O poder só é exercido, quando o é, pela necessidade da sobrevivência ou da procriação. Esta e a realidade. O homem tem capacidade de, por sua racionalidade, contornar essas pulsões naturais e agir altruisticamente, até mesmo por chegar à compreensão de que é beneficiando a humanidade como um todo que se é beneficiado a longo prazo. Isto o homem pode concluir, pois é capaz de fazer previsões futuras. Vontade de poder, até que pode existir e existe, mas não como princípio condutor das ações. Trata-se de um comportamento circunstancial.
Outro erro de Nietzsche, ainda, é considerar a moral altruísta como uma fraqueza. Para ele, ser compassivo, solidário, generoso, bondoso e coisas assim é ser inferior. Nada disso. Uma pessoa pode ser tudo isso com altivez, dignidade, nobreza, sem humildade e nem soberba, com modéstia, assertividade, fortaleza e bravura. O ser humano verdadeiramente humano é o virtuoso e a belicosidade não é uma virtude, nem vaidade, nem presunção. É com essas qualidades que se poderá construir uma verdadeira civilização, em que as pessoas viverão em um mundo próspero, justo, harmônico e fraterno e no qual alcançarão a felicidade e a realização de suas vidas.
Mesmo discordando desses pontos, tenho uma grande admiração por Nietzsche, por sua ousadia e firmeza em proclamar seu ateísmo e sua oposição às religiões e a todo comportamento mentiroso e de conveniência. Não considero que suas idéias sejam afinadas com o nazismo e o antijudaísmo, como se diz por aí. Assim como Marx, Darwin, Freud, Planck, Einstein e Sartre, Nietzsche foi um dos filósofos que moldaram o século XX e o espírito livre-pensador, irreligioso, democrático, liberalista e fisicalista que, felizmente, veio para substituir o obscurantismo religioso, dogmatista, absolutista e retrógrado que, infelizmente, ainda prevalece em certos lugares.
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domingo, 19 de dezembro de 2010
Professor, basicamente, que problemas o senhor vê na Filosofia de Nietzsche?
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