sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Qual a sua definição para "intelectualóide"? Abraços.

A própria palavra já diz: uma pessoa que se passa por intelectual sem, de fato, o ser. Considero que intelectual não é apenas uma pessoa que domine vastos conhecimentos. Um médico, um engenheiro, um empresário podem dominar vastos conhecimentos sem serem intelectuais. O intelectual é aquele que tem conhecimentos mais teóricos e consegue correlacionar o saber de sua área específica com as demais áreas do conhecimento humano.

O passo seguinte é ser um erudito, isto é, que domina seu campo de saber em profundidade e abrangência superlativas. Já o filósofo se caracteriza principalmente por ser uma pessoa que reflete e questiona. Normalmente ele deve ter conhecimento de filosofia e história da filosofia, e, portanto, ser um intelectual, mas não necessariamente. Alguém pode ser um filósofo sem que seja intelectual e nem todo intelectual será um filósofo. Uma característica do filósofo é seu amor e sua busca pelo saber e, mais que o saber, pela sabedoria.

Erudição e sabedoria são, certamente, conceitos bem distintos, como já está mais que provado. Antes de tudo devemos distinguir inteligência de conhecimento. Conhecimento é acúmulo de informação, certamente correlacionada e sistematizada. Inteligência é habilidade em aplicar o conhecimento na solução de problemas, práticos ou teóricos. A inteligência é o “hardware” e o conhecimento é o “software”. A pessoa pode ser inteligente e ignorante ao mesmo tempo. Erudita é uma pessoa inteligente e de muito conhecimento, sendo, assim, capaz de argumentar, articular o pensamento, persuadir, expor uma idéia, desenvolver um raciocínio, sempre com grande embasamento. Mas o erudito pode não ser sábio. Sábio é aquele que usa o conhecimento que tem (que pode ser muito ou pouco) e a inteligência, de modo proveitoso e adequado, isto é, de modo a acarretar a maximização da felicidade do maior número de pessoas, de modo a, em tudo, ser justo, equitativo e respeitoso do direito alheio (inclusive dos seres irracionais e inanimados) e pricipalmente, agir sempre colocando a bondade como primeira prioridade. Sim, porque ser bom é mais valioso do que ser justo e honesto, pois o justo e o honesto podem ser frios e calculistas mas o bom é sempre justo e honesto, e, portanto, sábio. Se o sábio for também erudito então termos a pessoa humana com as melhores qualidades que se pode encontrar pois ela será também modesta e virtuosa em todos os outros aspectos. É o ideal do filósofo da grécia antiga ou do “santo” dos primeiros cristãos. Isso não significa que seja casmurro. Certamente o verdadeiro sábio é alegre e jovial.

Existem dois conceitos de filósofo. Um amplo e um restrito. Segundo o amplo, filósofo é todo aquele que se debruça sobre a realidade para refletir, questionando e buscando respostas (mesmo que não as ache). Assim, não se requer nenhum tipo formal de estudo para ser-se filósofo, na concepção ampla. Na concepção restrita, um filósofo é um profissional, com diploma universitário, mestrado e doutorado na área, detentor de um amplo e profundo conhecimento de tudo o que trata a filosofia e do que disseram os grandes filósofos, aliado à habilidade de, ele próprio, fazer uso das ferramentas de raciocínio para construir sua visão da realidade, com a devida competência retórica e pedagógica para expô-la didatica e convincentemente ao público. Considero-me um filósofo no sentido amplo.

Tenho uma história familiar inteiramente intelectual. Meu pai, o pai dele e o pai do pai dele eram professores, respectivamente de Geografia e História, Línguas Eslavas e Química. Meu pai no Ensino Médio, Meu bisavô e avô, na Universidade em Viena e eu lecionei Física e Matemática em Universidades e no Ensino Médio (vejam meu currículo em meu blog: www.ruckert.pro.br/blog). Meu avô, partidário da libertação da Hungria e da Tchecoslováquia do Império Austríaco, emigrou para o Brasil em 1906, por intercessão do pai dele, que era professor do Arquiduque Francisco Ferdinando, para não ser preso. Aqui ele, que não era lavrador em uma colônia de imigrantes agrícolas, acabou como professor no Mosteiro de São Bento no Rio. Ele falava oito línguas: Alemão, Tcheco, Russo, Inglês, Francês, Italiano, Espanhol e Português.

Por parte de minha mãe não era diferente, pois o pai dela, Almirante médico, era primo de Rui Barbosa, meus tios foram intelectuais, um deles médico do exército, pesquisador da cura da Tuberculose no Sanatório de Itatiaia. Todos meus tios e primos são professores, advogados, médicos, engenheiros, militares ou funcionários públicos e sempre tiveram bibliotecas. O pai da mãe do meu pai foi adido comercial de Portugal no consulado de Belo Horizonte e tinha uma grande biblioteca. Em minha família não há empresários e nem ruralistas. Assim, posso dizer que meu pendor para os livros é, realmente, hereditário. Meu espírito inquiridor, questionador, libertário e anarquista, mesmo que contidos em um vaso polido por um comportamento e um estilo refinado e aristocrático, me foram passados por meu pai e minha mãe, que os possuiam em grau elevado e que sempre me descortinaram horizontes amplos de possibilidades de um mundo harmônico, fraterno, tolerante, livre e igualitário, mas responsável, ético, solidário, educado, honesto, disciplinado, bem como gentil e alegre. Meus pais foram meus heróis por tudo o que fizeram. No jardim principal de Barbacena há uma placa em homenagem ao trabalho social de minha mãe.


Considero que todo aquele que goza do privilégio de possuir uma facilidade de entendimento intelectual, ou alguma sensibilidade artística ou qualquer dom especial que o destaque, sem que tenha feito nada para merecer isto, tem a obrigação de colocar seu dom a serviço de todos, para o aumento do bem estar, do conhecimento, da sabedoria e da felicidade da humanidade. Este é o significado de sua vida. Quem tem o dom da música e da palavra, cumpre sua missão de fazer o mundo melhor por suas ações, independentemente do que isto possa lhe trazer de recompensa. Da mesma forma os empresários. Eles têm uma delegação coletiva implícita de trabalhar para o bem da coletividade.

O mais interessante é que nenhum mérito pode me ser atribuído por ser eu quem sou, pois tudo me foi concedido naturalmente, sem que eu tivesse que me esforçar para obter o conhecimento, a sensibilidade ou a inteligência que atribuem a mim. Mesmo o caráter me foi presenteado. Assim, valor algum se pode dar a tudo que faço, pois o faço por deleite e sem esforço. Este é um mistério que Calvino explicava em termos dos eleitos. Mas eu admiro quem obtém seus méritos por esforço.

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