sábado, 22 de outubro de 2011

Professor, compartilho de sua visão quanto ao poliamorismo. Sou, inclusive, um praticante. Minha pergunta, no entanto, restringe-se ao ideal altruísta. Como, em sua opinião, abastece-se uma causa que exige combustível infinito? Como burlar um ciúme...

(continuação da pergunta): ...que, muitas vezes, é inato as nossas características humanas? Como esquecer que se, eventualmente, não pensarmos somente em nós mesmos, não teremos outra garantia de felicidade numa vida que aparenta ser única? Que o amor é possível, não tenho dúvidas. Pergunto, entretanto, se ele é viável. E, principalmente, se é possível mantê-lo vivo sem corromper-se.

Resposta:

O ciúme não é inato. É um condicionamento cultural, ligado à noção de posse do ser amado. O fundamento do poliamorismo é a total independência de cada pessoa em relação às demais. Portanto é fundamental que ninguém dependa financeiramente de ninguém. Se essa condição não for preenchida, não se consegue ter a liberdade que o poliamorismo concebe. Isto não significa que pessoas que mantenham uma relação erótico-afetiva não possam compartilhar despesas na manutenção de seus projetos comuns.

Quando ao egoísmo, não se trata de um saudável desejo de felicidade pessoal, mas uma doentia concepção de que a satisfação dos próprios desejos tem que ser obtida a qualquer custo, doa a quem doer. E o altruísmo também não é a negação de si mesmo para servir aos outros ilimitadamente. É a concepção de que o outro tem tanto valor como nós mesmos e que nossas ações devem ser feitas para a maximização da felicidade global e não só a nossa. Assim se é capaz de se sacrificar pelo bem comum. Mas não a ponto de se viver uma vida completamente infeliz para fazer os outros felizes. Nisso tudo é preciso haver um balanço, pelo qual a pessoa busca sua felicidade sem causar infelicidade aos outros.

Para sermos felizes é preciso, justamente, que não pensemos apenas em nós mesmos, como também que não deixemos de pensar em nós mesmos. É isso que o poliamorismo vem atender e propiciar a maximização da felicidade e sua maior disseminação entre as pessoas. Pensando em nós mesmos, pelo poliamorismo, assumimos a possibilidade de amarmos a mais de uma pessoa ao mesmo tempo e consentimos na realização pessoal, social e carnal desses amores, de forma declarada, aberta e permitida. Pensando no outro, pelo poliamorismo, não exigimos que nossos amores amem exclusivamente a nós, permitindo que também amem a outras pessoas e realizem plena a abertamente esses amores. Isso é honestidade, maturidade, decência, honradez e nobreza. Além de evitar sofrimentos inúteis que a sufocação de amores sempre traz, essa liberdade concede à pessoa uma leveza de espírito e uma alegria que possessividade e ciúme nenhum é capaz de propiciar.

Isso é perfeitamente viável, mesmo que não seja necessário (pode-se perfeitamente ser feliz monogâmicamente), e não exige infinidade de combustível nenhuma, nem burlar nem corromper nada. Pois o importante é que todo relacionamento envolva compromisso (mesmo quando múltiplo) mas não de perenidade. Que seja infinito enquanto dure. Que compromisso é esse, então? O compromisso de dedicação, de lealdade, de honestidade, de sinceridade, de carinho, de interesse, de companheirismo. Mas não de exclusividade nem de perenidade. Traição é uma torpeza inadmissível, pois significa a quebra da lealdade. Ao ocorrer uma nova paixão, se correspondida, que os relacionamentos anteriores sejam cientificados previamente. Desse modo todos os envolvidos podem ser grandes amigos.

Uma questão que é colocada é a do surgimento de filhos. Ora, os filhos serão sempre de seus pais, mesmo que os pais tenham outros maridos ou mulheres. E eles são responsáveis pelos filhos pelo resto da vida. A não ser que sejam pessoas completamente desclassificadas. Na casa de quem morarão os filhos? Para mim o ideal é que as casas sejam enormes para abrigar essas famílias estendidas que, inclusive, compartilhando as despesas, farão um economia tremenda. Na primeira infância a presença constante da mãe é essencial, mas depois a escolha fica à vontade. Sem brigas por quem seja responsável pelo custeio disto ou daquilo. Os dois são responsáveis, segundo suas possibilidades. Acho isso tão simples. Não consigo entender essas brigas por dinheiro. Seja generoso que tudo dá certo.

Finalmente quero abordar a questão do sexo casual, sem envolvimento sentimental. Porque não? Qual o problema? Nesse caso nem precisa haver consentimento e nem se configura infidelidade e traição, desde que isto já seja admitido explicitamente como uma possibilidade para todos os envolvidos. Parceiros eventuais e esporádicos não fazem parte da família estendida de que falo, a não ser que deixem de ser eventuais e que um vínculo afetivo forte venha a surgir.

Filosofia, Ciência, Arte, Cultura, Educação

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