domingo, 7 de novembro de 2010

O que mais lhe agrada na música de Brahms?

Aprecio muito Mozart por seu melodismo fluente, suas harmonias bem postas, seu estilo galante, sua forma correta, sua orquestração luminosa. Mas acho um tanto frívolo, superficial. Para mim Haydn, menos genial mas igualmente talentoso, com estilo bem semelhante ao de Mozart, é mais profundo. Beethoven, então, nem se diga. Além de todas as qualidades de Mozart, tem uma dramaticidade muito mais marcante. Sua música é grave e vibrante ao mesmo tempo. Sua invenção é sem par. Ora é de um lirismo capaz de enlevar o espírito às alturas. Ora é marcialmente arrebatador. Quem reuniu essas qualidades em um outro gênero foi Verdi, na ópera, em que Beethoven não se sentia à vontade. Mas, para mim, o maior de todos foi Brahms. É o herdeiro de Beethoven já num contexto romântico em que ele soube, como ninguém, disciplinar a emoção mais tocante e apaixonada com um rigor formal de suprema elaboração, sem comprometer a expressão dos sentimentos, aliando sua altíssima sensibilidade com a máxima inteligência musical e uma férrea vontade e dedicação ao árdua trabalho de compor como quem esculpe o mármore e dele tira vida, como Michelângelo ao seu Moisés: Parla! Realmente, Brahms não foi inovador em coisa alguma. Ele é um epígono do classissismo dentro do romantismo. Como o foi J. S. Bach dentro do barroco. De certa forma Wagner também o foi. Mas Brahms levou ao supra-sumo a expressão da beleza por meio da música. A beleza que vém, não só do mundo, mas, principalmente, de dentro da alma do homem. A beleza da sensibilidade e da inteligência, aplicadas com vontade ao mister da criação musical. Brahms alia força e delicadeza, vigor e lirismo numa construção de impecável rigor, chegando a ser áspera. mas de sublime sentimento.

Na segunda metade do século 19, Brahms navegava contra a corrente da música, conduzida por Berlioz, Liszt e Wagner. Seu portentoso vigor, contudo, ensejou a continuidade da tradição germânica de Bach, Haydn, Mozart, Beethoven, Schubert, Mendelsohn e Schumann e o surgimento de nomes como o eslavo Dvorak, e o francês Cesar Franck. Dentre as quatro sinfonias de Brahms, vejo a primeira como a mais severa, a segunda a mais lírica, a terceira a mais sombria e, no entanto, enérgica e a quarta a mais magestosa e arcaica. Todas associam um exacerbado romantismo, na linha do "Sturm und Drang" (Goethe, Schiller) alemão ao mais completo arcabouço acadêmico formal, na herança de Beethoven. Em Brahms vejo a síntese dialética do romantismo de Schumann com a dramática arquitetura de Beethoven (como se vê em sua mestria no uso da forma sonata em seu desdém pelo poema sinfônico), bem como do rico passado musical alemão de Bach com a renovação da harmonia e da orquestração, que ele levou às últimas consequências, quase impressionistas.

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